Sou
fã de muitas coisas que existem na Argentina. Das dezenove vezes que estive por
lá, quatro foram ao encerrar o “Circuito Andino”, de carro e uma ao Ushuaia, de
ônibus. No entanto nessas incursões ao território de “los Ermanos”, todas,
dispensei alguns dias na encantadora Buenos Aires. Fui só duas vezes a
trabalho, para receber curso da IBM, nas demais, só passeio!
Quanto
aos argentinos, posso surpreender a muitos. Sempre que tive contato, foram ricos em cordialidade e gentileza. Confesso, muitos surpreendentes! Numa vinda de
Bariloche de carro, parei num posto de gasolina para abastecer, já na entrada da cidade foi quando pedi informação para chegar a região do hotel. O cara pensou um pouco e disse que
era meio complicado e falou: - Me segue, pegou seu carro e se foi. Era longe. Pois me levou até lá, sinalizou,
me abanou e se foi adiante. Nem me deu oportunidade de agradecer ou
remunerar... Fiquei positivamente pasmado!
Nas
duas últimas estadas, dezembro de 2017 e agosto de 2019 a tristeza de ver a
situação de decadência reinante, passei a considerar que deveria ir me despedindo. Na
sequência com o Covid19, essas viagens que fazia todos os anos, já seriam
naturalmente suspensas. Dói muito ver uma cidade tão pujante, elegante, orgulhosa e alegre, que
conheci na Páscoa de 1971, com seus restaurantes, casas de show e teatros
espetaculares em vertiginosa decadência!
Abandonando
por um momento o lado triste dessa época que estamos passando, vamos lembrar o
que é bom, alegre e que nos traz a felicidade de viajar! Mas atenção, lá,
gostoso é ir no Inverno! Verão se torna uma cidade muito quente, nada acolhedora:

O
espetáculo de Balet Clássico no Teatro Colon. O chá da tarde ou na noite com
show no Café Tortoni, (existe desde 1858), Calle Florida para caminhar à toa.
Bife de chorizzo (corte retirado do miolo do contrafilé) no Palácio de Las Papas
com sua inigualável "papa suflê" (batatas corte chips que ao fritar incham se tornando formato bolas de ping-pong). Requintado Shopping Atlântico para algumas
comprinhas. Casa Rosada esticando até San Telmo para visitar a praça e muitas e variadas lojas de quinquilharias, brechós e cristais valiosos.
Cemitério Recoleta com os restos
mortais de Eva Peron e seus túmulos abertos sob singela janela de vidro. O
“dolce far niente” na Praça San Martin sob suas gigantescas Figueiras, transmitem uma Paz Inebriante! Conhecer a “Boca” e seu curioso estádio de futebol do Boca
Juniors. No Estádio do River Plate já assisti a um magnífico show de Michael
Jackson (que descanse em Paz!). Puerto Madero e seus luxuosos restaurantes e
dali um passeio pelo Rio Tigre! Zoológico, é dentro da cidade.
Na Cidade Porteña, pode-se ir de carro e rodar livremente pois o trânsito – considerando o tamanho
da cidade – é ótimo! Tudo isso valia a pena ir diversas vezes aquela rica cidade! Valia.
Parece que não vale mais. Todo esse show de encantamentos, é coisa de um
passado recente. Não existe mais aquele charme e brilho. Agora tudo é deprimente, o que era brilhante, agora se ofusca.
A
despeito de lojas e restaurantes fechados, espetáculos reduzidos, quero exaltar
o que eu
mais recomendava, a começar pelas casas de Tango: -
Señor Tango, Tango Porteño o maior, La Ventana, El Viejo Almacén, Madero Tango,
Piazzolla Tango, são os que considerava fantásticos!
No
entanto, hoje a destacar o Bellini Casa de Tango, de pequeno porte que aproveita o
prédio de um antigo cinema com ótimo jantar, mas o melhor de tudo é que eu participei
do show naquela noite, de forma involuntária, inesperada mas marcante, quase célebre!
Antes,
relato uma questão particular de saúde. Tenho alguns tipos de alergia - grande
desafio da Ciência Médica para o Século XXI - e minha dificuldade de respirar
pelo nariz já me fez dependente químico severo de conta-gotas com medicamento
vasoconstritor, por anos. Consegui, a caro custo, me livrar deles há algum
tempo, mas mantenho tratamento à base de antialérgicos tradicionais. A “onda
moderna” da minha alergia, seja ela rinite, sinusite ou sei lá o que, é de espirrar!
Espirro! Mas espirro com um vigor italiano!
Voltemos
ao Bellini Casa de Tango. Jantar, como disse foi ótimo. O espetáculo estava por
começar. Garçons com o mínimo de ruído possível, retiram pratos e talheres do
lauto jantar produzindo aquele ruído típico de limpar mesas. A expectativa provoca tensão!
O respeitoso silêncio de uma plateia bem-educada, já se fazia
presente dando um ar solene que é como tratam o Tango. Quase sagrado!
Coceirinha
no nariz. Passo as costas da mão vigorosamente tentando diminuir aquele
desconforto. Não adiantou nada, veio um contido espirro que vibrou meu corpo
inteiro. Só um espirro! Só que não. Veio outro que não consegui segurar com a mesma determinação anterior. Umas dez pessoas olharam para trás. Fiz um gesto com
a cabeça assumindo o torturante momento. Veio mais um e aí TODOS olharam para
trás. Então contei com a gentil contribuição da Elaine me dizendo em tom baixo,
mas com os dentes serrados:
- Vá ao banheiro, agora!
- Dão sei si cunsigu
sein esbirar até lá... Beu dariz está bein intupidu...
É.
A gente fala fanhoso quando está sob ataque dessa merda de rinite
alérgica! Preciso soar o nariz fortemente para aliviar. Minha resistência maior
para ir ao banheiro, é que tinha de subir um andar, em uma escada aberta ao salão principal
– onde todos nós estávamos – e seria visto durante todo o percurso que quis
evitar, caso tivesse continuação da crise de espirros. Expliquei isso a Elaine,
mas por sorte não obtive sua permissão para me manter à mesa!
Levantei
e fui. Aí desabou o Mundo. A escada tinha uns 30 degraus e eu dava um espirro a cada dois degraus! Os espirros se assemelhavam ao "Kiai" do Bruce Lee em seus filmes de Karatê. Agudos e de altíssimo volume. No banheiro soei o nariz por diversas vezes com toda a força o que me aliviou um pouco, depois de diversas tentativas. Recomposto, voltei a mesa para então ouvir sobre a repercussão, com um "suave" tom de repreensão dela...
- Parabéns! Conseguiu chamar atenção de toda plateia! Ninguém ficou alheio aos teus vigorosos espirros, até aos músicos alguns até riram! Argentino é tímido, senão teriam te aplaudido por roubares o show! Quanto o som de soar o nariz, pensei que era a saída de um navio no porto!
Meu orgulho derreteu mesmo reconhecendo que me tornara conhecido em Buenos Aires. Muitos haviam acenado com a cabeça, num cordial e simpático sorriso. Fou muito legal saber do reconhecimento e admiração de todos, eu suponho!!!