quarta-feira, 19 de agosto de 2020

16) - Coalhada é melhor que aspirina

Meus estimados amigos,

Tenho que afirmar nessa crônica, que mesmo com uma enorme dor de cabeça pelo “day after” de um pileque, mas que, ocorrendo numa época da nossa vida, eu quero dizer na Juventude, tudo era bom, maravilhosamente bom, até a dor de cabeça! Tem uma canção de Charles Aznavour (* 22/mai/1924 a 01/out/2018) cujo verso diz " Quand J'avais vingt ans", que enaltece a alegria de "quando tive vinte anos"!

Foram alguns ou muitos pileques especialmente à época, que pela minha idade, era-me proibido o ingerir bebida alcoólica! Não é o caso que conto hoje, mas muito deles na “menor idade” e acontecia obviamente escondidos de minha zelosa Mãe. Em muitos retornos de baile em plena madrugada, ela levantava, para aplicar seu “bafômetro-nasal” que possuía, a examinar o hálito desse delinquente juvenil! Bafo de bebida ou cigarro, castigo garantido: - Não sai de casa no próximo baile!

 

16) Coalhada é melhor que aspirina...                                          

Durante o Serviço Militar fiz bons amigos em Santiago. Dentre eles, três conterrâneos que incorporados um ano antes de mim, chegaram ao posto de Terceiro Sargentos. Algumas vezes em finais-de-semana  que permanecia em Santiago e para fugir um pouco da da caserna, dormia na casa deles.

Depois de dar baixa, fui convidado a passar um final de semana com eles a curtir um baile de pré-carnaval, muito comum na época no Clube dos Sargentos e Sub Tenentes. Convidei Nandinho a me acompanhar aquela bela festa do “Tríduo de Momo”! Felizes, lustramos os sapatos e fomos alegres a Santiago para tal o baile!

A programação foi perfeita. Os amigos Sargentos eram excelentes anfitriões. Nos acolheram maravilhosamente bem e nos levaram ao Clube onde havia um grande salão, mesa de pista, garçom “convencido” que facilitou a entrada de dois litros uísque comprado fora do clube e lá estávamos nós, cedo antes de começar o baile! Um balde de gelo colocado à mesa e partimos para a ação etílica! Copos altos cheios que se usava nessa época e até a boca do bom escocês – no caso um “escocês” de Bento Gonçalves - para falar a verdade, ligeiramente vagabundo, barato, mas era a conveniência financeira daquilo que se podia pagar e bebemos, aliás, bebemos tudo muito rapidamente! Muito boa banda e o baile começa!

Eu e Nandinho idiotamente nos orgulhamos de acompanhar o ritmo de consumo dos bem experimentados amigos nessa arte de encher a cara. Foi um porre de ”juntar guri”!

Nem sei a que horas e sem “pegar ninguém” se é que ao menos tentei, esqueci que Nandinho estava comigo e simplesmente fui embora. Abandonei todos no meio da “Batalha Carnavalesca”! Não valia mais a pena permanecer no local. Estava difícil enxergar o salão. Nem mesmo saber onde era. Cheguei em casa, caí no sofá-cama e adormeci de babar no travesseiro. Não lembrei que Nandinho estava comigo, que não conhecia a cidade e era longe. Nessa época Santiago já era uma cidade grande. Cometi o legítimo abandono de incapaz.... Incapaz sim, porque quem bebe como ele bebeu, ou melhor, como nós bebemos, a capacidade geográfica, aquele GPS mental que alguns de nós temos, se reduz a zero absoluto. Daí, incapazes!

Pois lá pelas tantas, alta madrugada chega o ruidoso Nandinho. Barulhento, ainda com grande volume uísque no sangue, na cabeça, no fígado, sei lá onde se esconde toda aquela porcaria que a gente ingere. Ele absurdamente falante e eu querendo tanto seu silêncio. Alegre e gabola, porque o danado tinha “levado uma guria em casa!” Não mais que isso, mas já era um ponto alto na escala da Arte de Conquistar Mulheres no Carnaval! Confesso que me encheu de inveja, pura, sincera!

Pior é que pelo que descreveu, a menina morava no outro extremo da cidade! Como achou a casa de volta, nem imagino, nem ele imaginava. Na verdade, ficou uma incógnita para sempre. Nunca descobrimos!

A casa em que estávamos hospedados, não tinha o requinte de acomodação nem os cuidados de um Lar Clássico, onde uma Dama sempre dá seu toque de aconchego, limpeza etc... Mas afinal, três jovens solteiros de seus vinte e pouquíssimos anos vivendo livremente em sua própria casa, isso era irrelevante, não seriam daqueles que se preocupam com “futilidades”! Acho que alguns até consideram que quanto maior a bagunçada, mais caracterizada como “Casa de Macho”!

Pois nessa noite, tinha na cozinha uma panela com uma sobra de leite, já abandonado há dias. Não havia essa bobagem de se dar o luxo de ter uma geladeira, pois o tal de leite estava prá lá de azedo que causou ao Nandinho, - não entendi o motivo - notável atração, solene e de eloquente admiração:

- Coalhada!!! Adoro Coalhada!

- Tá Nandinho, puta-que-te-pariu, encerra esse assunto de cozinha e vai dormir pô! Toma uma aspirina e vai te deitar! Pára de me encher o saco que eu quero dormir...

- Não! Sem aspirina. Minha aspirina será a essa coalhada! Coalhada é muito melhor que aspirina! “glut, glut, glut”!      Fausto!

- Hã!

- Não lembro direito uma coisa: - Sou eu que gosto de coalhada ou é meu pai?!

- Sei lá, porra!

- É o meu pai, Fausto!

- Ah tá! E daí Cara, vamos dormir seu chato!

- Mas eu detesto Coalhada! 

- Puta-que-pariu! Por que tomou se não gosta, tchê? 

- Não sei?!

Já com a voz fininha e – segundo contou no outro dia - a boca salivando água salgada:

- Acho que eu vou vomitar...  Huuââââ...

Saltei da cama apavorado. Lá se foi uma hora para limpar aquela composição horrorosa de leite podre com uísque por todo o chão  da cozinha! A fragrância não despertava nenhuma alegria. Só ódio. Detestável!  

O quanto gostamos ou curtimos o baile não tenho a menor ideia, mas inesquecível foi a dor de

cabeça no domingo e aquele gosto amargo de cabo de guarda-chuvas na boca. Que passado maravilhoso tivemos!

 

Porto Alegre, 20 de agosto de 2020.


10 comentários:

  1. Quantas vêzes fizemos essas aventuras,hehe.Só saudades.

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  2. Bah! Deu até lembrança das saudosas ressacas da juventude!

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  3. Que bom! Ficou a saudade e as lembranças de bons tempos!

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  4. Lembrei de uma galinhada na praia que comprei com o Novaes, quem bebia uma garrafa de cachaça primeiro! Adivinha o resultado????

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  5. Quis dizer...que competi com o Novaes....

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  6. Lembrança de bebedeira, até lembrei de uma, duas, três, .....

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