quarta-feira, 9 de março de 2022

96) Quando a Atitude Supera a Argumentação.


No início da Década de sessenta, General Duílio Lena Berni fundou o Colégio Comercial de Jaguari, com a primeira turma do Curso Noturno Técnico Ginasial de Contabilidade. Em se tratando desse horário, a movimentação de aceite predominante foi a de todos aqueles que por alguma razão haviam abandonado seus estudos na sua juventude. Um dos raros meninos, era o Décio e eu, os demais, inclusive meu irmão Sérgio fazia parte num total de uns trinta novos alunos. Eram homens maduros beirando aos trinta anos. Por essa razão e também pela Boa Cultura reinante na época, o respeito ao Professor era pleno. Silêncio em sala de aulas e a reverência ao Mestre fazia-se notar a maravilha da Autoridade do Saber vigorando firmemente. Lógico, isso incomodava os dois meninos acostumados a um pouco de fuzarca!

O que aliviava, era quando no intervalo, que chamávamos de “recreio”, a alegria dos novos estudantes tornava a vida estudantil mais descontraída! Tínhamos um expoente, o sr. Trônio, cavalheiro de um humor refinado e inteligente. Até seu tamanho, um italiano vigoroso e careca total, fazia de suas piadas ainda mais engraçadas!

Não há quem não sinta saudades da época em que a sala de aulas tinha um “quadro negro” de cimento, que na verdade era verde onde o Mestre usava giz branco e apagador de feltro produzindo uma poeira de deixar todos grisalhos; os que ainda tinham cabelos, é claro. Embora que no primeiro ano só tinha uma turma, o intervalo era anunciado por um sino badalado pelo próprio Diretor da Escola! À medida em que os anos foram passando, novas turmas foram agregadas à primeira, formando um grande grupo de estudantes da noite.

Por ser noturno, minha mãe reservava o privilégio de na manhã seguinte ser poupado de levantar cedo! Lá estudei por sete anos, até me preparar, nem tão bem preparado, para o desafiante vestibular para Administração de Empresas.

Nesses tempos, o meu sonho dourado era ter um carro. Tínhamos na Escola o Professor de Biologia – Médico recém-chegado à Tribo – que tinha um “Fusca” azul claro, que ao chegar defronte ao prédio fazia uma redução no motor, gerando um “ronco” em que eu e Décio babávamos de inveja! Nenhum dos nossos colegas tinha carro, então esse sonho parecia inatingível!

Muitos anos foram passados, eu já morando na Capital, em dois anos consegui ter meu “próprio fusca”! Primeiro sonho realizado. Muitos anos depois tive um encontro ao acaso com o ex-colega, o carismático Trônio. Ele me contou que também sonhara no passado com o tal fusca da época, isso me aconteceu lá no início da Década de Setenta onde os “desejos automobilísticos” também evoluíram bastante. Surgia o conforto de automóveis com ar condicionado. Até então tínhamos apenas um aquecedor interno, muito bom no inverno que vinha do aquecimento do motor, como disse, muito prestigiado no Inverno, entretanto nos dias quentes o recurso era abrir o “quebra-vento”, para ter pelo menos um vento morno na cara!

Num início de Verão, já se anunciando muito quente, Trônio bem de vida, me contou que decidiu que na próxima troca de carro naqueles dias, adquiriria com o desejado ar condicionado. 

Soube mais adiante, que acompanhado da esposa para ajudá-lo a escolher a cor do novo carro, etc. Foi a Santa Maria para fazer a negociação em alguma revenda. Em lá chegando, anunciou ao vendedor que queria o modelo com o ar condicionado, e para sua surpresa, foi frontalmente contrariado pela esposa!? Chegaram a discutir. Como ele era um Homem de “boa paz”, mas astuto, simplesmente não evoluiu a discussão nem a compra. Assunto encerrado, voltaram para casa no carro velho sem trocar uma só palavra. Os dois emburrados! Nem se olhavam!

Ao sair de Santa Maria, Verão se fazendo presente nos termômetros, carro todo fechado, Trônio liga sorrateiramente o aquecimento interno, aquele vindo diretamente do motor. Viagem que seque por uns cinquenta quilômetros ao sol, o interior da cabine do pequeno veículo com um calor insuportável, equivalente ao interior de uma chaleira ao fogo, quando se rompe o silêncio com ela tomando a iniciativa:

- Benhê!

- Fala! (Responde secamente!)

- Quando voltarmos a Santa Maria num outro dia, se tu realmente queres ter um carro com ar condicionado, acho que tens razão, deves comprar. Vai ser mais confortável, né?

- Tá bem. Se é o que tu queres. Semana que vem tenho que voltar, aí eu compro!!!

Carro novo com ar condicionado

Semana seguinte voltou e comprou finalmente o confortável e bom carro, equipado com ar condicionado! Atitude, ação sempre é "mais convincente"!

 

4 comentários:

  1. Como era bom naqueles tempos,saudades!!

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  2. Gosta muito de carro e acordar tarde até hoje.

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  3. Como não sentir saudades ,daquele tempo?abraço..

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  4. Hehehe bela vingança. Conseguiu convencer a esposa com sabedoria. No calor é insuportável um carro sem ar-condicionado. Objeto de consumo de muita gente na época.

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