152) Motos: - Também me Aposentei!
Nas relações de amor e paixão por
esporte, aventura e “pequenas loucuras”, o paraquedismo sempre estará em
primeiro lugar por razões bem fáceis de explicar e de entender, por óbvio. Já
relatei diversas vezes de quem nunca saltou de paraquedas, jamais entenderá os
sentimentos e emoções que povoam nossa mente "caindo de uma aeronave"! Velocidade de até duzentos e cinquenta quilômetros por hora, o chão
se aproxima vertiginosamente e por inacreditável que pareça, o paraquedista controla
toda angústia e o medo residente na mente. Sensação de domínio da própria Existência,
quando não se pode errar e não se erra! Talvez um ou outro "errinho"... De igual forma, impossível transmitir em
palavras todo esse sentimento, considerando que tanto se fala em falhas
humanas, ali a falha é letal e creiam-me, isso nem “passa na cabeça”! Convicção
plena de que acidente, jamais acontecerão. Sem essa convicção, o segundo salto não aconteceria, isto é, o medo – verdadeiramente necessário – superaria a coragem e
ficaríamos sossegados sentados à sombra vendo os outros saltarem!
O momento crítico do medo - nos primeiros saltos são classificados como PAVOR - acontece "lá em cima", entre a desaceleração do motor da aeronave, colocar-se na porta e SAIR! Como num passe mágico e é mágica a transição daquele medo horroroso, converte-se instantaneamente em forte euforia, alegria extrema, inexplicável. A sensação é de poder sem limites que é sem dúvidas o resultado químico de uma forte injeção de endorfina a substituir ou somar com a adrenalina no sistema, que ocorre em milésimos de segundos! Observe um dia, o passeio de um pássaro a voar com as suas asas bem abertas planando em alta velocidade! Já imaginou o que aquele pássaro está sentindo? Pois é...
Está certo. Já me envolvi em acidente de paraquedismo e
foi grave. Mesmo assim, entre parar por um tempo e voltar a saltar, considerando o mesmo raciocínio daqueles que enfrentam o sacrifício
de deixar de fumar, cada dia de abstinência, é contado nos dedos. Pois eu
apenas interrompi minha sequência de uns trezentos saltos, nessa doentia
contagem: Três anos, dois meses e três dias após o tal acidente, voltei a
saltar e assim me mantive por não mais de uns trinta saltos, para então abandonar
definitivamente o paraquedismo! Hoje sou um Paraquedista “em repouso”, pois
aposentado me soa legal, parece punição.
A outra paixão, mais duradoura e a proposta de hoje, é o motociclismo. Não de competição, mas de laser para
passeios, pequenas viagens e o gostoso “curtir o vento na cara”! Tudo começou
com o Cezar me estimulando, como contei na última crônica. Meu limite foi depois de trinta e três anos de pilotagem, quando chegava à “provecta idade” dos sessenta
e três anos.
De novo, não foi o medo, mas sinais,
avisos vindos de alguma Entidade Superior que sutilmente Disseram:
- “Fausto agora chega, deixa isso
no passado, porque tua maturidade impõe certos limites”...
Não foi aviso através de um "Áudio Espírita"! A percepção nem
sempre vem muito clara pelo verbo. Tampouco pelas advertências dos amigos e parentes que nos
amam. Essas são insuficientes para mudar nossos rumos e atitudes. O homem é naturalmente orgulhoso e principalmente teimoso! Como pertenço a "essa segunda classe"...
Meu "Abençoado Aviso" não verbal, veio durante
um passeio de moto, durante um calmo feriado porto-alegrense de dois de fevereiro. Proposta de rápida viagem de uns 100 km., acompanhado da minha esposa Elaine saindo de Porto Alegre, rumo à Serra. Ideia inicial ir até a Tenda do Umbu, local onde motociclistas se juntam habitualmente unicamente a celebrar um belo dia de sol! Fica em um local em meio às curvas da BR 116, rumo a Nova Petrópolis. Estrada de muitas curvas agraciadas de um ar puro e fresco a soprar em meio às árvores nativas da Região. Cheiro de mato faz parte dos prazeres que o motociclismo - fora da cidade - propicia!
Nessa época eu tinha minha segunda moto
apelidada “Sete Galos”. Uma Honda CBX 750, preta, tipo esportiva com motor quatro
cilindros, 82 CV de seis marchas. O apelido foi atribuído em função do número
sete, correspondente ao galo, que tem essa numeração no jogo de azar, o jogo do bicho! O mais notável nesse equipamento é o vigoroso ronco do seu motor, quando em sua potente aceleração, deixa o piloto com “cabelos em pé!” Irônico, mas é verdadeiramente um barulho ensurdecedor que provoca profundo prazer para quem gosta de motor forte, poderoso!

Pois nesse dia com a cidade vazia,
saímos no início da tarde em direção ao destino planejado em estrada inicialmente plana e sem curvas, que para
pilotar uma moto não tem graça... Plano e em linha reta, chega a dar
sono. O retorno foi programado a voltar por Taquara e Cachoeirinha. Estrada
vicinal de topografia acidentada que com suas curvas e o sobe
& desce, faz da viagem desafiadora e prazerosa, com uma “boa
velocidade”. São muitos câmbios nas suas seis marchas, mudanças de direção bruscas, inclinações fortes em curvas que elevam o
nível de adrenalina e a emoção é gratificante! Para quem gosta "disso", evidentemente!
Como recebi o "primeiro aviso": - Fui ocasionalmente retido durante alguns quilômetros por um micro-ônibus transportando uma banda de musica, sem chance
para ultrapassagem. Aquele “conjunto festivo” em alegre trânsito, supostamente cantava e certamente bebia muita cerveja! Acontece que tristemente sem uma educação razoável, pois seus componentes jogavam fora suas latinhas de cervejas vazias e "quase" vazias pela janela fora. Isso aconteceu por três vezes tendo uma delas atingido o para-brisas
(carenagem) da minha moto. Buzinei enlouquecidamente, sem a menor reação de “solidariedade”
do motorista... Para me livrar deles, tive que executar uma ultrapassagem arriscada, muito além da minha tolerância e até competência, mas deu tudo certo. Estresse agudo sem maiores consequências! Ufa! Seguimos em frente tentando recuperar a alegria do passeio!
Segundo aviso: - Já na entrada da Capital,
em sua primeira sinaleira (semáforo) junto à fábrica da Coca-Cola, na Av. Assis Brasil, o sinal verde baixou
para amarelo, "enrolei o arame" (desacelerei...) e iniciei a frenagem. Percebi contudo a presença de um automóvel Fiat-147 branco, que se anteciparia à travessia cortando minha frente,
entretanto, creio que ele percebendo que eu vinha “rápido” e ainda não tinha seu sinal em verde, gentilmente freou supostamente me
cedendo a vez e foi então que levantei a aceleração! Subitamente o cara mudou de ideia e seguiu em frente a me cortar a já arriscada passagem. Freei bruscamente! Mas freei mesmo! Foi a minha mais enérgica freada dos trinta e a três anos de prática... Felizmente o bom freio à disco fez a motocicleta parar!
Elaine na carona, desavisada se
projetou contra mim com todo seu peso e aceleração. Fui parar acavalado sobre o tanque de gasolina e o
coração saindo pela boca! O Fiat se foi embora tranquilo como se não tivesse cometido nenhum pecado! Fiquei parado, tirei o capacete, respirei fundo umas vinte vezes, recoloquei o capacete e segui em frente!

Terceiro e definitivo aviso: - Já muito próximo de
casa, avenida do Forte, chegando a uma sinaleira fechada com alguns poucos carros aguardando, tangenciei por sobre o passeio - totalmente vazio e seguro - a me colocar a frente de
todos, na “pole position no grid de largada!" Acontece que um pequeno degrau
desnivelando a pista de rodagem com a de passeio, fez escorregar a roda dianteira e deitar
aquela monstra de 241 kg. Sim, um vergonhoso tombo! Felizmente dado a baixa velocidade, Elaine saiu por
cima de mim a passos largos se batendo em si mesma enquanto fiquei caído com uma perna embaixo da moto - sem me ferir - e a moto por alguns segundos com seu motor "resmungando" lentamente! Parecia querer me dizer alguma coisa em código indecifrável, mas que entendi muito bem: - CHEGA!
Acudido por transeuntes, ambos sem ferimento algum a considerar, nenhuma gota de sangue ou esfolado, a não ser o amor próprio ferido e envergonhado de tamanha “barbeiragem! A maior
dificuldade foi colocar aquela máquina em pé novamente, mas obtive ajuda solidária imediata! Volta para casa com o
sentimento claro de que foi o derradeiro passeio naquelas inebriantes
setecentos e cinquenta cilindradas de força!
Esse terceiro aviso, me remete a um sinal de alerta para o nosso natural relaxamento quando da proximidade do destino final da viagem. Livro "Biplano" escrito por Richard Bach, (antigo piloto de caças da Força Aérea Americana que até hoje pilota pequenas aeronaves por puro diletantismo, também autor de sessenta e um livros, inclusive do "best seler" Fernão Capelo Gaivota), que alerta serem os últimos minutos de uma viagem, já bem próximo de casa, o de maior perigo. Traz o livro a espantosa estatística de que 80% dos acidentes de carro com morte, acontecem a menos de dois quilômetros de casa! "Estamos quase chegando, e não chegamos..."
Pois bem. Creio firmemente que interpretar esses três avisos claros de que estava na hora de parar. Seria pouco inteligente se não entendesse e atendesse os avisos, devendo considerar também que com trinta e três anos pilotando moto dentro de cidade e algumas viagens sem nenhum acidente, já é uma bela marca a celebrar e encerrar o ciclo plenamente satisfeito! Moto vendida e algumas poucas fotos mais um capacete bonito, sem sinais de esfolados, sem cicatrizes ou trincas graças ao meu bom Anjo da Guarda, Eficiente e Dedicado. Depois desse derradeiro dia: 02 de fevereiro de 2011, estou "dando uma folga" a Ele!!!