terça-feira, 30 de abril de 2024

 154) Advertência severa, mas necessária de um Pai Zeloso!

Sempre tive uma severa fiscalização em todos movimentos enquanto criança, pelo meu pai, mas principalmente e em tom bem mais severo por minha mãe. Vivendo numa cidade pequena e com quatro irmãos mais velhos, sobrava para mim um quinto lugar na hierarquia, que significava ser o "neném da Casa", o mais carente de cuidados especiais e até repreensão mais severa, pelo menos assim me parecia ser, sem, entretanto obter concordância dos outros manos.... Último filho/filha, sabe do que estou falando...

Como disse, cidade pequena muito arborizada, com morros de cerrada mata nativa e com razoáveis condições de escalar, é sem dúvidas uma bela e bucólica cidade, a de Jaguari (Do Tupi Guarany, Rio das Onças) com uma atraente praia de rio com areia branca e tantas atrações com locais para as mais diversas travessuras, artes e tantas coisas que mereciam preocupação constante dos pais, sem que eles tivessem autoridade ou tempo suficiente para inibir o livre vai e vem dos mais peraltas. Saltar de árvores ou da ponte no rio em época de enchentes, era a glória!

No ponto mais central da cidade, o Rio Jaguari faz uma curva de 45 graus e tem no centro dessa curva, uma ilha de uns três hectares também muito arborizada com seu “Salso Chorão”, taquaras, e arbustos dos mais diversos! Era esse nosso local ideal para refúgio com milho verde furtado em lavouras das cercanias, a ser assado em fogo de chão para devorar com extremo entusiasmo! Hoje ao ver espigas de milho verde à venda em supermercados, chego salivar e misteriosamente sentir até seu cheiro maravilhoso do milho assado ao ponto e com alguns grãos queimados! Que delícia!

O ponto forte e mais ameaçador e gerador maior de preocupação dos pais, sempre foi esse rio, que mesmo sem ser tão caudaloso, mas que em época de cheias – especialmente na Primavera – se torna muito perigoso, e por óbvio, a aventura mais atraente. Subir nas árvores e pontes para voar “de bico” nos locais mais profundos, era a glória da molecada. Eu junto, é claro e é nisso que concentra minha maior saudade de Jaguari da “minha infância querida!” 

Tristemente essa preocupação nunca foi infundada. Em períodos normais de "meteorologia pacífica", o rio tem águas claras e cristalinas, no entanto em períodos chuvosos, a água fica marrom, agitada com perigosos redemoinhos. Assim, sem visibilidade do que se tem flutuando, são diversos riscos.  Muitos guris, ainda bem jovens, sem dominar a natação, sucumbiram afogados para desespero e tristeza profunda de algumas Famílias, que me traz amargas lembranças! Perdi amigos por lá! Valida-se fortemente o adágio popular: - “Cautela e canja de galinha, nunca é demais para ninguém!” Só que o adolescente reconhecerá isso muito tempo depois dessa fulgurante época na vida de todos nós!

A pesca, nunca foi a melhor alternativa nesse rio, pelo menos para mim. Algumas vezes em tempos antigos – falo da primeira metade do Século Vinte – contam meus irmãos e tios pescadores que conseguiam pescar dourados de bom porte. Já antecipei em crônica anterior que poucas vezes pesquei, dando nítida preferência às caçadas. No rio, gostava mesmo é de toda a confusão e o trabalho de acampamento em meio à Natureza que uma pescaria exige. O melhor de tudo, era reservado aos momentos de comilança em panela de ferro à beira do rio e ao dormir em rústicas barracas com chão forrado de pelegos, com o glorioso acordar cedo da manhã, com o cheiro da mata, da fumaça do fogo de chão e o glorioso cantar dos sabiás! Melhor: Sempre tem um colega que acordava mais cedo, contribuía somando ao cheiro de fumaça o do café passado na chaleira ou “cambona de lata”!

A repreensão anunciada no título dessa crônica é hilária, mas real. Assisti a preocupação de um Pai, o sr. Bella - com alguma limitação cognitiva - também sem o polimento apurado para uma expressão mais branda, ao admoestar seu filho Délcio, meu contemporâneo e parceiro dessas aventuras, ocorrido em uma das suas saídas a uma dessas perigosas pescarias:

- Óia guri: Tua me vai pescá, mas se tu me voltá morto, te mato a pau!

O ocorrido divertiu muito e "contei para todo o mundo", no que ficou gravado ao folclore da cidade por muito tempo e se trata de um fato coroando a vida no Interior como especial e cheia de alegres histórias e estórias a nos divertir. O importante, quando se narra, é o manter a segurança de o que falar das pescarias, se não vier recheada de algum exagero, não valeu a pena ou sequer existiu! Mantendo aquela máxima que diz:  Aquele que não sabe contar sua história, não merece tê-la vivido. Aquele que não tem história para contar, não merece ter nascido”!

10 comentários:

  1. Amigo Fausto. Ótima história!
    Felicitações !
    A gurizada de hoje não fazem mais "arte"- só celular.
    Ivan

    ResponderExcluir
  2. Hoje somos homens formados, mas quem viveu a infância e adolescência nas peraltices rurais entendeu muito bem como foi maravilhosa a sua adolescência. Sempre admirei a sua sagacidade literária nos nossos poucos encontros internacionais na gloriosa IBM. Sobre os meus 77 anos é uma grande benção reencontrar tão preciosos amigos do RS. Aqui, S. José dos Campos-SP.

    ResponderExcluir
  3. A enchente de hoje está terrível. A barragem de Jaguari está a transbordar, há
    vários trechos bloqueados na estrada para Santa Maria, a água do tio Jaguari está perto de atingir o soalho da ponte. A coisa tá "osca" por aqui! Como dizia minha mãe " o diabo tanto mexeu no olho do filho que entortou !"!!

    ResponderExcluir
  4. Mais uma bela estória! Que infância e adolescência maravilhosa que vc teve! A preocupação dos pais faz jus, pois não se pode brincar no rio, é muito perigoso.

    ResponderExcluir
  5. Feliz de quem teve infância e adolescência em Jaguari. Não fiz "arte" como tu mas posso dizer q foi a melhor época da vida. Muito bom relembrar através de tuas crônicas. Abç

    ResponderExcluir
  6. Parabéns, meu amigo! Mais uma bela crônica. As experiências da infância e da juventude marcam nossa vida para sempre! Bidart

    ResponderExcluir
  7. Quando a tragédia se abate sobre um povo ele se reinventa e geralmente sai fortalecido. Espero que isso aconteça aqui no nosso RS.

    Tida

    ResponderExcluir
  8. Eu sai pequena da minha cidade Natal mas tive a sorte de ter tudo isto em nossa Capital na zona Sul.

    ResponderExcluir